A Lenda do Xadrez e os Juros Compostos

Lahur Sessa e o Rei jogam Xadrez

De uma antiga lenda brâmane vem uma maneira divertida e surpreendente de conhecermos o poder dos juros compostos. Foi deliciosamente descrita no livro “O Homem que Calculava”, de Malba Tahan (1)



Um Rei Triste e um Inventor Sábio


Conta uma antiga lenda Indiana que, no séc. VI, vivia um Rei que já havia conquistado todas as terras e riquezas que podia conquistar. Tinha o mais belo palácio, as mais belas esposas e os cofres abarrotados de ouro e pedras preciosas. Mas, justamente por não lhe faltar nada, fosse em bens materiais, fosse em conquistas e glória, sentia-se triste e enfastiado…

É então que vem ter consigo um sábio brâmane (2) chamado Lahur Sessa, que dizia ter um novo jogo que seria a solução para a vida tediosa do Rei. Apresenta-lhe o Shaturanga, que mais tarde conheceríamos como Xadrez (3). O Rei ficou de tal forma encantado com as estratégias e as variadas maneiras de se ganhar o jogo, que disse que o sábio brâmane poderia lhe pedir o que quisesse como prémio por tão grande alegria proporcionada não só ao monarca, como a toda a sua corte.

Foi então que Sessa, surpreendentemente, pediu ao rei que lhe desse um grão de trigo pela primeira casa do tabuleiro do jogo, dois grãos pela segunda casa, quatro grãos pela terceira casa, e assim por diante, até a 64ª casa do tabuleiro. O rei concordou, sem perceber que a quantidade de grãos de trigo aumentaria exponencialmente.

Quando os seus conselheiros calcularam a quantidade pedida, o número total de grãos de trigo perfez mais de dezoito trilhões, mais precisamente 18.446.744.073.709.551.615 (dezoito trilhões, quatrocentos e quarenta e seis mil biliões, setecentos e quarenta e quatro biliões, setenta e três mil milhões, setecentos e nove milhões, quinhentos e cinquenta e um mil seiscentos e quinze… ufa!) grãos!



Como Assim? Vamos tentar perceber…


Isso nos leva à nossa percepção do poder dos juros compostos. Os juros compostos são calculados com base em um valor principal, uma taxa de juros e um período de tempo. A fórmula para calcular os juros compostos é:


A=P(1+r/n)nt


onde:

  • A é o valor total após o tempo t;
  • P é o valor principal;
  • r é a taxa de juros anual;
  • n é o número de vezes que os juros são compostos por ano; e
  • t é o tempo em anos.


Assim como na lenda do xadrez, os juros compostos aumentam exponencialmente com o tempo. Quanto mais tempo o investidor mantiver seu dinheiro investido, mais juros compostos ele ganhará. Por exemplo, se forem investidos € 1.000,00 a uma taxa de juros anual de 5%, com juros compostos anuais, por 10 anos, você terá € 1.628,89 no final do período. Ou seja, um acréscimo de aproximadamente 62,9%. Para efeito de comparação (talvez para emular o pensamento do Rei em um primeiro momento), examinemos a fórmula dos juros simples:


A=P(1+rt)


onde:

  • A é o valor total após o tempo t;
  • P é o valor principal;
  • r é a taxa de juros anual; e
  • t é o tempo em anos.


Desse modo, os mesmos € 1.000,00 investidos à mesma taxa de 5% ao ano, pelos mesmos 10 anos, renderiam ao investidor “escassos” € 1.500,00 ou seja, um acréscimo de 50%. Ao analisarmos a diferença entre as taxas ((62,9%-50%)/50%), temos um ganho 17,8% superior a favor dos juros compostos. Quanto maior o montante investido, obviamente, maior a diferença em termos absolutos, ou seja, em quantidade de dinheiro.

Como pode ser visto, existe uma grande diferença entre a estratosférica quantidade de grão que teria sido ofertada a Lahur Sessa (4) e os ganhos dos juros compostos sobre os juros simples. Mas nossa intenção foi mostrar que, sempre que utilizamos cálculos exponenciais ao invés de um somatório de parcelas semelhantes ao longo do tempo (ou no caso de Sessa, ao longo do tabuleiro), o resultado é consistentemente mais positivo.


Referências da Lenda do Xadrez e os Juros Compostos


(1) TAHAN, Malba; O Homem que Calculava; Rio de Janeiro, Ed. Conquista, 1938.
(2) Sacerdote do credo hinduísta, responsável pelo ensino religioso e orientação dos crentes.
(3) No jogo original, as atuais torres eram elefantes de guerra e os bispos eram os vizires (ministros ou conselheiros do Rei).
(4) Segundo a lenda, o Rei, temeroso de ter que esvaziar os seus celeiros para dar o prémio requerido, ofereceu a Sessa um palácio, servos e ouro, prontamente aceites pelo sábio brâmane.

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